quarta-feira, 31 de agosto de 2016

A inexplicável decisão de Rodrigo Janot de suspender a delação de ex-presidente da OAS

Na semana passada, vazou através da revista Veja que a delação do ex-presidente da OAS, Léo Pinheiro, envolvia o ministro Dias Toffoli, do STF. Até aí morreu Neves, não era o primeiro nem seria o último vazamento nas delações da Lava-Jato. Ledo engano. Imediatamente, gerou-se uma reação corporativa através do famigerado ministro Gilmar Mendes, o falastrão-mor do Supremo 366 dias do ano (sua disputa com Marco Aurélio Mello pelo primeiro lugar é acirradíssima).

Gilmar, que adota o silêncio das maritacas e a sutileza de um trem em movimento, imediatamente subiu nas tamancas e mais uma vez deu largas à sua rasteira pirotecnia verbal dizendo que os procuradores da República precisam calçar "sandálias da humildade" e não podem se achar o "ó do borogodó" por receberem atenção da imprensa. Em matéria de chamar a atenção da imprensa, Gilmar é PhD com pós-doutorado. Ninguém mais do que ele adora ver-se rodeado de microfones, gravadores e celulares. Gilmar Mendes gosta mais de um spot ou foco de luz em público do que esses bichinhos de luz (ou aleluias) que sentem tanta atração pela luz, que se suicidam por ela. Os sobreviventes viram cupim. Quem precisa urgentemente caçar as sandálias da humildade é ele, Gilmar, protagonista de um estrelismo desvairado. E quem se julga o ó do borogodó e também ele, Gilmar, com seu ar professoral esnobe. 

Deixemos Gilmar Mendes para depois. Surpreendente e inexplicavelmente, o Procurador-Geral da República Rodrigo Janot reagiu à verborragia agressiva de Gilmar (sua marca registrada) suspendendo a validade da delação de Léo Pinheiro! Ou seja, decidiu beneficiar os denunciados e punir o delator, que na verdade é um colaborador na acepção legal e reconhecida do termo. Subverteu tudo e, como assinala a Veja, jogou no lixo uma delação de extrema importância:

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, tomou a decisão mais controversa da Operação Lava-Jato na semana passada. Diante da repercussão da reportagem de capa de VEJA, Janot informou que as negociações de delação do empreiteiro Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS, estão encerradas. O vasto material produzido ao longo de cinco meses de tratativas entre a Procuradoria e o empreiteiro foi enviado para o incinerador, eliminando uma das mais aguardadas confissões sobre o escândalo de corrupção na Petrobras.

Para quem vive atormentado desde 2014, quando surgiu a Lava-­Jato, a decisão de Janot representa um alívio ou até a salvação. Léo Pinheiro se preparava para contar os detalhes de mais de uma década de simbiose entre o poder e a corrupção. Em troca de uma redução de pena, o empreiteiro ofereceu aos investigadores um calhamaço com mais de setenta anexos. São capítulos que mostram como a corrupção se apoderou do Estado em diversos níveis.

VEJA teve acesso ao conteúdo integral de sete anexos que o procurador-­geral decidiu jogar no lixo. Eles mencionam o ex-­presi­den­te Lula, a campanha à reeleição da presidente afastada Dilma Rousseff e, ainda, dois expoentes do tucanato, o senador Aécio Neves e o ministro José Serra. A gravidade das acusações é variável. Para Lula, por exemplo, as revelações de Léo Pinheiro são letais. Lula é retratado como um presidente corrupto que se abastecia de propinas da OAS para despesas pessoais. O relato do empreiteiro traz à tona algo de que todo mundo já desconfiava, mas que ninguém jamais confirmara: Lula é o verdadeiro dono do famoso tríplex no Guarujá, no litoral de São Paulo — comprado, reformado e mobiliado com dinheiro de uma conta em que a OAS controlava as propinas devidas ao PT.

O tríplex do Edifício Solaris é o tema de um dos anexos que narram crimes praticados pelo ex-presidente. O empreiteiro conta que, em 2010, soube, por intermédio de João Vaccari, então tesoureiro do PT, que Lula teria interesse em ficar com o imóvel no prédio. Vaccari, que está preso, pediu ao empreiteiro que reservasse a cobertura para o ex-presidente. Não perguntou o preço. E quem pagou? Léo Pinheiro responde: “Ficou acertado com Vaccari que esse apartamento seria abatido dos créditos que o PT tinha a receber por conta de propinas em obras da OAS na Petrobras”. Ou seja: dinheiro de propina pagou esse pequeno luxo da família Lula. Para transformar o que era um dúplex em um tríplex mobiliado, a conta, segundo a perícia, ficou em pouco mais de1 milhão de reais. Pinheiro esclarece até mesmo se Lula sabia que seu tríplex era produto de desvios da Petrobras. “Perguntei para João Vaccari se o ex-presidente Lula tinha conhecimento do fato, e ele respondeu positivamente”, diz o anexo.

Como nenhum outro vazamento de delação na Lava-Jato levou à suspensão da delação correspondente, essa decisão inédita de Janot permite no mínimo as seguintes conjecturas:
☛ o vazamento escancarou uma carga maior sobre o ex-presidente Lula, personagem que -- pelo que se tem visto -- gera um inexplicável excesso de zelo e uma espantosa precaução do nosso Judiciário. Teria sido este um dos motivos do recuo de Janot?
☛ falou mais alto o espírito corporativo do PG Janot, pelo fato do vazamento incluir um ministro do Supremo? Ou foi pura paúra o que motivou o PG? Amarelou com a toga do Supremo?
☛ se, constitucionalmente, todos são iguais perante a lei, por que só no caso da menção a Toffoli a delação foi suspensa? Ministro do STF é, perante a lei, um igual "diferente"?
☛ Janot alegou que o vazamento denunciado inicialmente pela Veja referia-se a anexos "inexistentes" na delação -- a revista, na sua réplica, não só confirmou tudo que afirmara, mas deu detalhes de cada anexo, um por um. Quem é que, efetivamente, está mentindo nesta história? A Assessoria de Imprensa da PGR, em reportagem publicada neste sábado (27/8) na revista Veja afirmou: "Durante as negociações do acordo da OAS, foram discutidos fatos a respeito do ministro Toffoli. O procurador-geral da República não disse em momento algum que o anexo não existia". E agora, Janot, como é que fica?!
☛ Pergunta de um pagão em matéria jurídica: Janot não estaria, de fato, obstruindo a justiça?
☛ Janot subverteu completamente a máxima do in dubio pro reo (na dúvida, pelo réu): o réu declarado na delação é Léo Pinheiro e não Dias Toffoli.

Voltemos ao famoso ministro Gilmar Mendes. Ele arremete contra a delação que citou Toffoli com o mesmo ímpeto desvairado de Don Quixote contra os moinhos de vento. Gilmar não tem moral alguma para insurgir-se contra qualquer tipo de vazamento, porque ele é o maior "vazador" de si mesmo, porque frequentemente fala fora dos autos e antecipa seu voto em processos em andamento no STF, o que é um absurdo. Em setembro de 2015, Gilmar chamou os governos do PT de "cleptocracia", mesmo sendo o PT réu direto e indireto de inúmeros processos da Lava-Jato em andamento no STF e ainda não transitados em julgado. Ou seja, um ministro da Suprema Corte antecipa seu voto fora dos autos e não é declarado suspeito para opinar em processos contra o PT no STF. Que Justiça e que Judiciário são esses?!

Falar demais e ferir códigos de ética e jurídicos não são os únicos defeitos de Gilmar Mendes. Ele é um poço de malfeitos e sandices. Ele é grosseiro, rasteiro e insolente em seus comentários, é fervoroso amante da  baixaria vernacular. Ainda este mês ele disse que a Lei da Ficha Limpa foi feita por "bêbados", desrespeitando e insultando todos aqueles que trabalharam na elaboração dessa lei. Não é isso que se requer e se espera de um ministro de Suprema Corte.

Outro hobby do ministro Gilmar Mendes é sentar sobre processos no STF. Ele permanece imbatível como o rei dos pedidos de vista e o campeão disparado na retenção desses pedidos. Em levantamento efetuado em 2010, Gilmar tinha 22% dos pedidos de  vista do Supremo e retinha consigo os processos, em média, durante 462,67 dias!  Neste particular, ele é o Usain Bolt do STF, como se vê em levantamento feito em 2015



Sem qualquer delegação, Gilmar se arvorou de palmatória do mundo e virou uma versão togada masculina de uma vestal que vela pelo fogo eterno de verdades que só existem em sua cabeça, de tão deturpadas, distorcidas e/ou maltratadas por sua verborragia inconsequente e insuportável.
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PS - A revista Veja é frequentemente acusada de volta e meia fazer um jornalismo marrom, e concordo com isso. Mas, o fato incontestável é que os acusados por ela estrebucham, esperneiam e negam fatos em nome de suas mães, mas até agora ninguém conseguiu invalidar as alegações da revista -- nem no papo, nem na justiça. O máximo conseguido eventualmente foi o direito de resposta. Estará acontecendo o mesmo com Rodrigo Janot e a delação de Léo Pinheiro, da OAS?





Um comentário:

  1. Recebido por email de Tito Livio Barbosa em 03/9/2016:

    Esta matéria eu assino integralmente em baixo.
    Grande abraço,

    Tito

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