sexta-feira, 9 de outubro de 2015

O latim na nossa vida (VII) (Q a R)

Ver postagem anterior. O que estiver entre colchetes e em itálico é de minha responsabilidade.

Qualis artifex pereo! -- "Que artista morre comigo!". Segundo Suetônio, últimas palavras do imperador Nero antes de seu suicídio (Vida de Nero, XLIX).

Qualis vita, finis ita -- "Tal vida, tal morte". 

Quid -- "O ponto difícil", "o busílis". Em latim, pronome interrogativo cujo sentido é "quê"? "O peru de agora era uma ave qualquer, mas o toque literário da receita lhe imprimia o quid desejado". Carlos Drummond de Andrade, "Peru", Fala, Amendoeira.

Quid pro quo -- "Uma coisa pela outra", "confusão". Aportuguesado em quiproquó.

Quieta non movere -- "Não mexer no que está quieto". Variante popular nossa: "Deixa como está, para ver como é que fica". Locução frequentemente citada, entre outros, por Bismarck, em seu discurso de 14 de abril de 1891. De proveniência ignorada sob essa forma, assemelha-se mais a um trecho de Salústio (Catilina 21, 1): quieta movere magna merces videbatur, "parecia de  grande vantagem mexer no que estava sossegado". [Caio Salústio Crispo (86 a.C. — 34 a.C.) foi um dos grandes escritores e poetas da literatura latinaNasceu em Amiterno, na Sabina, em 86 a.C., em uma família interiorana, mas de posses, tendo uma formação requintada. Foi cedo para Roma, e recebeu apoio de pessoas de influência da sua família. Com o apoio de Júlio César, Salústio foi eleito questor, cargo que lhe assegurou uma cadeira no senado romano. Investiu contra adversários de César, e estes passaram a ser seus adversários. A inimizade que Salústio tinha para com Cícero se encontra refletida em sua obra; por exemplo, nos episódios relativos à conjuração de Catilina, o autor se mostra hostil a Cícero, não entrando em muitos detalhes quanto à importante participação daquele durante o ocorrido, não reproduzindo nem mesmo os discursos de Cícero no senado romano, discursos estes que até hoje são lembrados pela historiografia política. Em compensação, Salústio descreve com riqueza de detalhes o discurso de Júlio César, com quem colaborava. Salústio foi expulso do senado pelo censor Ápio Cláudio Pulcher, grande amigo de Cícero, sob a acusação de imoralidade, mas pouco depois foi reconduzido ao cargo pelo chefe e padrinho, Júlio César.]

Qui gladio ferit gladio perit -- "Quem com a espada fere, perece pela espada". Equivalente a : "quem com ferro fere, com ferro será ferido".

Qui tacet, consentire videtur -- "Quem cala, parece consentir" (Das Decretais, de Bonifácio VIII; V, 12, 43). Equivalente a "Quem cala, consente". [Bonifácio (em latimBonifacius - "aquele que faz o bem"; ca. 672 — 5 de Junho de 754 ou 755), de seu nome verdadeiro Wynfrith ou Winfrid (com o mesmo significado em anglo-saxão), e cognominado Apóstolo dos GermanosNasceu em Credtion, no Devonshire, filho de uma família abastada; foi contra a vontade do pai que se devotou, muito jovem ainda, à vida monástica. Estudou teologia nos mosteiros beneditinos de Adescancastre, perto de Exeter, e de Nursling, entre Winchester e Southampton, tendo por mestre neste último o abade Winbert, e acabando por ele mesmo por se tornar professor no mosteiro e ordenado padre aos trinta anos. Aí foi o responsável pela escritura da primeira gramática de latim produzida na Inglaterra.]

Quod erat demonstrandum -- "O que se tinha de demonstrar" (muitas vezes abreviado: Q.E.D.). Tradução latinade fórmula usada por Euclides para enunciar o resultado de uma demonstração. [Euclides de Alexandria (c. 300 AC) foi um matemático platônico e escritor possivelmente grego, muitas vezes referido como o "Pai da Geometria". Além de sua principal obra, Os Elementos, Euclides também escreveu sobre perspectivas, secções cônicas, geometria esférica, teoria dos números e rigor.]

Quorum -- "(O número) dos quais (é necessário)". Número mínimo de pessoas presentes necessário para que um órgão funcione.

Quosque tandem, abutere Catilina, patientia nostra? -- "Até quando, Catilina, abusarás de nossa paciência?". Apóstrofe que abre a primeira Catilinária de Cícero. Em geral, citam-se apenas as duas primeiras palavras.

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Reddite ergo quæ sunt Cæsaris Cæsari et quæ sunt Dei Deo -- "Dai então a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus". Resposta de Jesus Cristo aos fariseus que he perguntavam capciosamente se era preciso pagar tributo a César (S. Lucas, 20, 25, na tradução da Vulgata).

Repente dives nemo factus est bonus -- "Nenhum homem de bem se torna rico de repente" (das Sentenças de Publílio Siro).

Repetitio est mater studiorum -- "A repetição é a mãe dos estudos".

Requiem æternam dona eis, Domine -- "Dá-lhes, Senhor, o repouso eterno". Palavras da oração pelos mortos na liturgia católica. Daí o termo português réquiem, que indica o próprio ofício ou a música que o acompanha.

Requiescant in pace -- "Descansem em paz". Palavras do Ofício dos Mortos, gravadas na entrada de muitos cemitérios. O singular Requiescat in pace, "Descanse em paz", frequentemente aparece gravado em lápides. Abreviatura: R.I.P.

Rerum novarum -- "Das inovações". Primeiras palavras de uma encíclica do Papa Leão XIII, datada de 15 de maio de 1891, sobre a condição dos operários, e que assim começa: Rerum novarum semel excitata cupidine, quæ diu quidem commovet civitates, illud erat consecuturum ut commutationum studia a rationibus politicis in æconomicarum cognatum genus aliquando defluerent, "Uma vez suscitado, o desejo das inovações, que há muito começou a por agitação nos povos, forçosamente teria como efeito que os esforços de modificação acabassem por passar da ordem política para a ordem congênere da economia social".

Res judicata pro veritate habetur -- "A coisa julgada é aceita como verdade". Axioma de Jurisprudência. Também se diz Res judicata pro veritate accipitur. [O que transitou em julgado torna-se definitivo, não podendo mais ser modificado.]

Res, non verba -- "Fatos, não palavras". Emprega-se para dizer que uma situação exige ação, atos e não palavras. 

Res nullius -- "Coisa de ninguém". Locução usada em Direito para designar um objeto ou bem sem dono. 

Revertere ad locum tuum -- "Retorna ao teu lugar". Inscrição em portões de cemitérios.

Rex regnat, sed non gubernat -- "O rei reina, mas não governa". Palavras de Jan Zamoiski, chanceler da Polônia, depois adaptadas para lema do partido monarquista constitucional, na França. [Paulo Rónai cometeu aqui um engano sério e inexplicável. A frase "O rei reina, mas não governa" ("Le roi règne mais ne gouverne pas") é de autoria de Louis Adolphe Thiers (1797-1877), estadista e historiador francês, e foi proferida em 1830. Em 4 de fevereiro de 1830, Thiers assinou um artigo no Le National: "Le roi n'administre pas, ne gouverne pas, il règne" (The Oxford Dictionary of Quotations, Oxford University Press, 1999, pág. 770).]

Rixatur de lana sæpe caprina -- "Muitas vezes discute-se pela lã da cabra", isto é, por dá cá aquela palha, sem motivo sério (Horácio, Epístolas, Livro I, 18, 15).

Romæ omnia venalia esse -- "(Que) em Roma tudo está à venda" (Salústio, Jugurta, 8). Palavras com que alguns aristocratas romanos pintaram a Jugurta, jovem príncipe númida [da Numídia], a corrupção reinante em sua pátria. 






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