domingo, 5 de abril de 2015

Brasileiros nas contas suspeitas do HSBC (II) -- personalidades das artes e do entretenimento estão na lista

[Em 10 de fevereiro próximo passado, publiquei uma postagem sobre a presença de brasileiros nas contas suspeitas do HSBC, no escândalo conhecido como Swissleaks. Na postagem, informei que  várias personalidades políticas, do mundo do entretenimento, do esporte ou dos negócios estão envolvidas em um caso de fraude fiscal com suas contas no banco HSBC. Os clientes teriam utilizado artifícios para manter em suas contas dinheiro não declarado entre 2005 e 2007. O que estiver entre colchetes e em itálico no texto a seguir é de minha responsabilidade.]

Em reportagem do dia 23 deste mês de março o jornal O Globo lança um pouco mais de luz sobre o assunto, listando personalidades brasileiras do mundo do entretenimento identificadas na lista do HSBC. Todas elas negam ter feito operações ilegais, mas  nem todas comprovaram isso. Eis a lista publicada pelo Globo:

Marília Pêra -- US$ 834 mil em 2006/2007 (na edição impressa do jornal são US$ 834.133 -- valor em julho de 2006), em conta aberta em 22/2/1999.



Na sua edição impressa do dia 23/3, o Globo informa que o escritório Montenegro e Raman, que representa a atriz, não havia respondido ao pedido de esclarecimentos do jornal até o fechamento da edição.

Maitê Proença -- US$ 585.241 (edição impressa -- valor em julho de 2006) em conta aberta em 17/4/1990


A atriz, por email, informou ao jornal que não tem conta no banco suíço. A resposta -- digo eu e não o jornal -- é escapista, já o que interessa em primeiro lugar é confirmar e justificar a conta bancária identificada em 2006.

Claudia Raia e Edson Celulari -- US$ 135.723 (edição impressa -- valor em julho de 2006), no período de 05/3/2004 a 11/5/2006. Segundo o Globo, a atriz informou após a reportagem, por nota, que a conta bancária existiu de fato e que ela recolheu os impostos devidos. Em suas palavras: “Informo que a conta bancária citada — encerrada em 2006 — continha uma quantia que era uma reserva pessoal, fruto de muito trabalho, com seus devidos impostos recolhidos”.




Francisco Cuoco -- US$116.240 (edição impressa), em julho de 2006, conta aberta em 09/11/1994. Cuoco é representado também pelo escritório Montenegro e Raman, o mesmo de Marília Pêra, que também não forneceu os esclarecimentos solicitados pelo Globo.



Roberto Medina  -- US$ 0 (zero) em julho de 2006. Período em que teria sido correntista do HSBC na Suíça: de 16/01/1990 a 09/5/2000. Medina informou ao jornal, por sua assessoria, que tem conta no HSBC no Brasil mas nunca foi correntista desse banco na Suíça. 



Tom Jobim e Ana Lontra Jobim -- US$ 0 (zero) em julho de 2006. Período em que teriam sido correntistas do HSBC: 23/12/1993 a 06/7/1995; 12/01/1996 a 23/8/2005; e 09/02/1995 a 14/02/1996. O Globo tentou contatos com a Jobim Music, com o Instituto Tom Jobim e com a assessoria de Ana Lontra, mas não teve retorno de nenhum deles.




Andrucha (Andrew Waddington) e Ricardo Waddington -- US$ 0 (zero), em julho de 2006. Período em que teriam sido correntistas do HSBC: 03/7/1997 a 31/01/2000. Ricardo informou que nunca teve conta nesse banco, e Andrucha não respondeu ao Globo.


Andrucha


Ricardo Waddington

Hector Babenco -- US$ 0 (zero), em julho de 2006. Babenco teria sido correntista do HSBC de 25/4/1988 a 01/6/1992,mas informou ao Globo que nunca teve conta nesse banco suíco.



Jô Soares -- US$ 0 (zero), em julho de 2006 -- teria sido correntista do HSBC de 21/02/97 a 03/10/2001, de 11/4/1988 a 25/3/1997, de 01/9/1998 a 29/10/2002, de 03/5/2001 a 17/01/2003. Jô nega ter conta na Suíça (já teve, e no HSBC, pergunto eu?), diz que teve conta no HSBC de Nova Iorque mas não apresentou comprovantes ao jornal.



Jorge Amado, Zélia Gattai, Paloma Amado e João Jorge Amado -- US$ 0 (zero) em julho de 2006. Teriam sido correntistas de 25/01/2001 a 25/3/2003. Confirmaram que tiveram conta no HSBC suíço e que ela foi declarada, mas não comprovaram isso para o jornal. Segundo a assessoria da instituição, entre 2009 e 2012, a Fundação recebeu do Fundo Nacional de Cultura R$ 477 mil e captou pela Lei Rouanet R$ 1,2 milhões.





[As contas com saldos positivos listadas acima surpreendem por seus valores, como os de Marília Pêra, Maitê Proença, Claudia Raia/Edson Celulari e Francisco Cuoco. Essa turma mostra mostra uma capacidade de poupar absolutamente incomum para o cidadão brasileiro comum. 

Num raciocínio inteiramente lógico, o Globo lembra que diversas  das personalidades citadas receberam nos últimos anos recursos públicos por meio de leis de fomento à cultura -- como a Lei Rouanet e o Fundo Nacional de Cultura --  para desenvolver atividades artísticas, mas ressalta que "não é possível, porém, fazer conexão entre o dinheiro captado e os recursos que circularam nas contas bancárias na Suíça". 

Segundo O Globo de 23/3, Claudia Raia afirmou que a reportagem fez uma “associação leviana e irresponsável” da existência da conta à captação de recursos para seus espetáculos via Lei Rouanet. Na nota, Claudia disse que sempre realizou “corretamente a rígida e transparente prestação de contas exigida pela lei” e que “nunca pairou nenhum tipo de dúvida sobre a captação de recursos nas produções” das quais ela fez parte. Segundo ela, essas contas “estão disponíveis no órgão competente para qualquer tipo de consulta”.

Eis a lista publicada na edição impressa do Globo de 23/3/2015 de incentivos recebidos pelos artistas listados como correntistas do HSBC suíço:

‣ Claudia Raia -- por meio da Raia Produções, captou de 2009 a 2015, R$ 7,4 milhões via Lei Rouanet para os musicais "Pernas pro ar", "Charlie Chaplin" e "Raia 30 anos".

Edson Celulari -- por meio da Cinelari Produções Artísticas captou de 1997 a 2012, R$ 2,6 milhões para as peças "D. Quixote de lugar nenhum", "Fim de jogo", "Nem um dia se passa sem notícias suas"e "Dom Juan". 

Andrucha -- através de sua empresa Conspiração Filmes captou R$ 13,4 milhões, conforme dados do Ninistério da Cultura (Minc). Esse dinheiro se destinou a projetos como "Taça do Mundo é Nossa Casseta & Planeta O Filme", "Matador"e "Eu Tu Eles".

Marília Pêra -- através da Peramel Produções Artísticas captou R$ 100 mil via Lei Rouanet para montar e divulgar a peça "A filha  da ...", que estreou em 2002 com a própria Marília em cena.

Hector Babenco -- através da sua HB Filmes captou R$ 16,2 milhões para trabalhos como o filme "Carandiru"e a peça de teatro "Hell".

Roberto Medina -- ainda segundo o Minc, Medina através de sua empresa Rock World captou R$ 13,6 milhões para o Rock in Rio 2013 e 2015.

Fundação Casa de Jorge Amado -- esta instituição, que funciona em Salvador, conta com o apoio do Minc. Segundo a assessoria da pasta, ela recebeu do Fundo Nacional de Cultura entre 2009 e 2012 $ 477 mil, e captou pela Lei Rouanet R$ 1,2 milhão.

Fundação Tom Jobim -- catou R$ 1,7 milhão pela Lei Rouanet, usado em eventos como a exposição "Tom Jobim, música e natureza".

Só nessa diminuta lista acima rolaram R$ 41,37 milhões. Acho, e penso que muita gente concordará comigo, que há muito dinheiro escoando nessa avenida chamada Lei Rouanet. Já fiz postagem sobre isso em 29/10/2014. E a impressão que se tem, dificílima de ser eliminada, é que a fiscalização disso é zero, nula, nenhuma. Naquela postagem menciono, por exemplo, que em 2011 Maria Bethânia conseguiu a bagatela de R$ 1,2 milhão para fazer o blogue "O Mundo Precisa de Poesia", que contém um vídeo dirigido por AndruchaEm 2013, foram captados R$ 42.754.932,14 (pessoas físicas e jurídicas) dos R$ 117.970.281,19 autorizados (clicar em "Confira o relatório"), relativos a 495 projetos de Pessoas Físicas com captação. 


Se dentro do ambiente estritamente cultural os números assustam, imagine-se quando isso extrapola para outras áreas estranhas. Em 2012, entre os 18 projetos aprovados pelo Minc para a Região Sul do país para captação de recursos via Lei Rouanet há um simplesmente incrível: foram aprovados R$ 64,5 milhões para a restauração da Ponte Hercílio Luz, em Florianópolis!! Isso é que é atividade cultural, o resto é bobagem. Barbaridade, tchê!

Os petralhas não podem culpar FHC pela Lei Rouanet porque ela foi criada no governo Collor -- e ela vem há 12 anos sendo conduzida pelo PT e sua curriola. Em outubro de 2014, Juca Ferreira, ex-ministro da Cultura no governo do NPA (Nosso Pinóquio Acrobata, Lula) e coordenador de cultura da campanha de Dilma NPS (Nosso Pinóquio de Saia), disse que a Lei Rouanet é "nefasta". Segundo ele, "ela discrimina regiões como o Nordeste, o Norte, o Centro-Oeste, 80% do dinheiro que o Governo Federal destina vai para o Sul e Sudeste. E, dentro dessas regiões, ele vai para os mesmos grupos. Quem define para onde vai o dinheiro são os departamentos de marketing das empresas. O problema da Rouanet é que financia peça da Broadway, não tem critério. Considero nefasta a Lei Rouanet, ela prejudica a melhoria do padrão da cultura brasileira". 

Em 30/12/2014, Juca Ferreira foi nomeado ministro da Cultura do governo Dilma NPS, cargo que ele ocupou de  agosto de 2008 até o fim do segundo governo do NPA (01/01/2011). Antes disso, ele ocupou durante 5,5 anos o cargo de Secretário-Executivo do Ministério da Cultura - Minc (do início de 2003 até o final de julho de 2008, na gestão Gilberto Gil). Como é que esse cidadão, petista roxo, convive durante 7,5 anos com uma lei "nefasta" com poderes para alterá-la, e não faz absolutamente nada nesse sentido?!

Enquanto os petralhas se enrolam e nos enrolam com a tal Lei Rouanet, nosso dinheiro suado dos impostos continua  irrigando as hortas de um bando de agentes "culturais" (com e sem aspas), a maioria com projetos um tanto ou quanto bastante questionáveis.]



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