sexta-feira, 25 de julho de 2014

Dunga nega, mas jornalista da ESPN prova que ele participou da venda de jogadores de futebol

[O péssimo desempenho da nossa seleção na Copa do Mundo foi uma consequência natural dos desmandos éticos e gerenciais que há décadas caracterizam o futebol brasileiro. A CBF virou sinônimo de pilantragem, ações entre amigos e poleiro de cidadãos de reputação no mínimo turva -- aí estão João Havelange, Ricardo Teixeira e José Maria Marin que não me deixam mentir. Havelange, antes de se apossar da Fifa de 1974 a 1998, presidiu a CBD - Confederação Brasileira de Desportos, que foi extinta em 1979 -- sua trajetória na Fifa virou caso de polícia internacional. Ricardo Teixeira, ex-genro de Havelange (de quem se revelou um aluno exemplar de pilantragens), que presidiu a CBF de 1989 a 2012, virou também um habitué das crônicas policiais principalmente lá fora. Marin é um pigmeu ético e um gigante de incompetência, com a biografia medíocre resumida em dois gestos que retratam bem seu caráter rasteiro: o roubo de duas medalhas na cerimônia de premiação da Copa São Paulo de Futebol Júnior em 2012 e o roubo de energia de seu vizinho de apartamento.

Depois do fracasso da Copa, em plena expectativa por mudanças radicais no nosso futebol, Marin escolhe para coordenar nossas seleções o ex-goleiro Gilmar Rinaldi, que até  a véspera de sua indicação era empresário de jogadores. Como o pessoal de mau comportamento ético é muito unido, Gilmar escolheu Dunga como treinador da nossa seleção principal. Agora, o jornalista Lúcio de Castro (da ESPN) prova que Dunga intermediou também negociações de jogadores, como mostra o texto a seguir.]

Documentos provam ação como agente que Dunga nega

Lúcio de Castro -- ESPN, 24/7/2014

Dunga manteve por muitos anos um segredo bem guardado: a intermediação de transações em direitos econômicos de jogador de futebol. Quando foi questionado por esta reportagem sobre sua participação na venda do meia Ederson, em 2004, do RS Futebol Clube para o grupo Image Promotion Company (IPC), foi incisivo na negativa. Através da assessoria de imprensa da CBF, afirmou "não ter participação alguma na venda dos direitos sobre o vínculo do referido jogador".

Três documentos públicos, porém, mostram o contrário: uma nota fiscal da "Dunga Empreendimentos, Promoções e Marketing ltda", com a comissão no valor de R$ 407.384,08; o recibo assinado pelo próprio Carlos Caetano Bledorn Verri, o Dunga; e o comprovante bancário de transferência do clube para a empresa do treinador, no valor discriminado na nota. Não é o único conflito de interesse com o cargo de comandante da seleção brasileira nessa história: as ligações com os agentes do IPC vão muito além do que um único negócio.


Documentos comprovam intermediação de Dunga em negociação de Ederson

Documentos comprovam intermediação de Dunga em negociação do meia Ederson (clique na imagem para ampliá-la)

Em 14 de janeiro de 2004, o RS Futebol Clube negociou 75% dos direitos sobre o vínculo desportivo do meia Ederson, (Internacional, Juventude, Nice, Lyon e atualmente Lazio) com o grupo IPC, pela quantia de U$ 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil dólares). O IPC foi representado na negociação pelo empresário italiano Antônio Caliendo. A comissão do intermediário Dunga foi paga pelo clube gaúcho. Na nota emitida pela empresa "Dunga Empreendimentos, Promoções e Marketing ltda" está especificado o "faturamento de honorários profissionais pelos serviços prestados de assessoramento, acompanhamento e indicação de investidor na aquisição de direitos federativos e econômicos de atleta". A pedido do IPC, os direitos federativos foram repassados para o francês Nice, onde Ederson atuou por três temporadas.

No dia 8 de maio de 2006, os investidores do IPC fecharam a compra dos 25% restantes dos direitos que o RS Futebol Clube ainda tinha de Ederson pela quantia de U$ 575.000,00 (quinhentos e setenta e cinco mil dólares). Diferentemente da compra dos 75% anteriores negociados por Antonio Caliendo, Dunga já não consta mais como intermediário da transação e sim como o autor do depósito dos U$ 575.000,00, oriundo de uma agência do Credit Suisse em Mônaco, sede também do IPC e creditado para os responsáveis pelo RS Futebol Clube. Em processo judicial que corre na justiça gaúcha, Dunga nega que tenha sociedade na IPC, alegando que o depósito feito por ele foi um empréstimo para o IPC.

Matéria Dunga arte 2 - documento

Por trás do endereço do IPC, em Mônaco, estão mais revelações sobre as teias de relacionamento de Dunga. O investidor, para quem o treinador da seleção intermediou o atleta do RS Futebol Clube, encontra-se no mesmo endereço da World Champions Club (WCC), na Avenue Princesse Alice. A WCC é uma conhecida empresa de agenciamento no futebol. E entre os gestores está Antônio Caliendo, que representou o IPC na compra dos 75% de Ederson, onde Dunga ganhou comissão por intermediação. O meia não foi convocado pelo treinador em sua passagem anterior pelo comando da seleção, vindo a ser chamado em 26 de julho de 2010, primeira convocação de Mano Menezes, para o amistoso no dia 8 de agosto contra os Estados Unidos - quando ficou três minutos em campo e se lesionou.

A reportagem quis saber de Dunga se ele ainda tinha algum vínculo com a empresa. O treinador disse "não ter vínculo com a empresa em questão e que esta empresa o representou quando ele era jogador". Provavelmente não viu o site da WCC, onde é uma das estrelas e identificado como "um dos nossos últimos clientes", ao lado de Ederson e Maicon, convocado por Dunga para a Copa do Mundo de 2010. Não apenas isso: onde consta a relação e fotos dos futebolistas pelos quais respondem pela gestão, Dunga aparece em foto recente e não de quando era jogador.


Em seu site oficial, WCC, do italiano Antonio Caliendo, lista clientes: Dunga, Ederson, Maicon e QPR

Em site oficial, WCC, do italiano Antonio Caliendo, lista clientes: Dunga, Ederson, Maicon e QPR (clique na imagem para ampliá-la)

O inglês Queens Park Rangers também estrela o site. A WCC assumiu a gestão do QPR em 2004. Mesmo sem "ter vínculo com a empresa em questão", Dunga assumiu cargo no conselho de gestão do clube, formado por cinco membros. Por ser agente Fifa, Antonio Caliendo não podia figurar oficialmente entre tais conselheiros, e o técnico da seleção era seu rosto.

O segredo que Dunga trouxe bem guardado até esta quinta-feira atravessou incólume uma passagem de quatro anos à frente de uma seleção nacional. Tendo como base um discurso de comprometimento e amor pela camisa verde e amarela. Ao voltar esta semana, ressaltou a base moral que sustentava esse retorno: "Dificilmente uma pessoa muda em seus princípios, os meus são a ética, comprometimento, lealdade, transparência, trabalho". Ao lado do treinador, a comissão técnica tem Gilmar Rinaldi, que deixou de ser empresário de jogadores no dia em que assumiu o cargo de coordenador na seleção brasileira.

Leia também: Os bastidores e as relações que abriram as portas da Comary para a CBF TV

[A história malcheirosa do Dunga como dublê de empresário de jogador e treinador da seleção não se resume à lambança descrita acima. Hoje, o mesmo jornalista Lúcio de Castro faz nova denúncia cabeluda contra Dunga, a nebulosa história de uma suposta segunda venda do jogador Ederson. Essa segunda transação  se fez para o minúsculo Club Atlético de Las Piedras (Uruguai), cuja transferência jamais ocorreu, tendo como protagonista o advogado, braço direito do técnico do Brasil e secretário executivo do Instituto Dunga, Juarez Rosa da Silva. Isso ocorreu em 2007, quando Dunga já era o comandante da equipe brasileira.]

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