sábado, 14 de setembro de 2013

Máquina do tempo (Instituto Ilumina)

[Desculpem-me os leitores do blogue por voltar a falar no nosso setor elétrico numa mesma semana. Essa insistência não se deve apenas ao fato de ser engenheiro eletricista e ter trabalhado na área estatal praticamente a vida profissional toda (à exceção de quatro anos em uma consultora, a Iesa), inclusive e principalmente durante a gestão de Dona Dilma, a doce, no MME - Ministério de Minas e Energia. Minha insistência decorre de meu completo e irrevogável inconformismo com a ignorância e a incompetência da nossa Dama de Ferrugem também nessa área, e sua inequívoca incapacidade de ver e perceber que o setor elétrico é vital para o país. O problema é que com sua burrice pétrea e seu jeito grosseiro, autoritário e monocrático de dirigir o setor elétrico e o país, nossa supersimpática ex-guerrilheira está comprometendo não só o futuro do país, mas também -- e irreversivelmente -- os currículos profissionais de muita gente boa do setor elétrico.

Os comentários abaixo -- que endosso totalmente -- são do Ilumina - Instituto de Desenvolvimento Estratégico do Setor Energético, publicados ontem 13/9. Ver também as postagens de 02/5 deste ano e de 20/12/2012.]

Comentário: Fica parecendo que nós do ILUMINA somos uns chatos. Mas, não tem jeito, precisamos repetir: Nós avisamos! Ninguém pode dizer que não nos manifestamos contra as incoerências do modelo mercantil teimosamente implantado no Brasil desde 1995 e sem mudanças significativas em 2004. 

O Dr, Paulo Pedrosa, representante dos grandes consumidores de energia elétrica no mercado livre, no artigo do Valor abaixo, reclama com razão dos pífios efeitos da MP579 que pretendeu reduzir tarifas de energia elétrica. Talvez se ele tivesse acesso aos nossos documentos, poderia prever o fracasso da medida. É fácil perceber que, atuar sobre a parcela da geração para diminuir tarifa no Brasil sempre foi uma asneira.  Antes da MP 579, em média o custo do kWh gerado era apenas 30% da conta total. Nesse aspecto, o Brasil está bem na foto. Alguns exemplos de países com REAIS problemas de custo de geração como componente das suas contas finais : Reino Unido: 74%, Itália: 47%, Irlanda: 55%, Espanha: 44%, Polônia: 42%, Áustria: 42%, Holanda: 42%, Estados Unidos 58%. 

Ora, se apenas 20% das usinas hidroelétricas estavam para ser atingidas, de imediato, se entregassem a energia de graça, a diminuição máxima seria de 20% X 30% = 6%. Como nem toda energia é produzida por hidroeletricidade, e, apesar da ANEEL ter fixado tarifas miseráveis, a energia não é gratuita, a redução é ainda menor.

O presidente da ABRACE também reclama de que, hoje, a grande indústria no mercado livre é “subsidiadora” do resto dos consumidores. Na realidade, seu argumento é irrefutável. Já que adotamos o princípio que o tempo amortiza automaticamente ativos de geração ao invés de considerar esse efeito como um cálculo contábil, essa indústria também tem direito a essa dádiva e nós reconhecemos isso. Só que esse papel de “subsidiador” já foi exercido pelas empresas estatais por ocasião da descontratação compulsória de 2003. Nesse momento, por mais de 3 anos, o mercado livre teve acesso a energia firme mais barata do planeta: MWh a R$ 4!  

Ele também sabe que se São Pedro abre as torneiras, é possível comprar o mesmo MWh a R$ 16. Esse é o problema! Não dá para querer receber as duas benesses (ativos amortizados, exuberância hidrológica) sem democratizar também a segunda! 

Como palavra final, o ILUMINA convidaria o Dr. Paulo Pedrosa a uma viagem ao passado na máquina do tempo. Ao chegar em 1995, ele ficaria feliz por poder pagar uma tarifa 100% menor do que a atual. Ao passar por 2004 verá que, naquele ano, a tarifa industrial já tinha subido 60% e nenhum dos seus colegas reclamavam, pois escapuliam para o mercado livre para aproveitar o Bolsa MW oferecido pelo governo da Ministra Dilma às custas da Eletrobrás. 

A nossa máquina do tempo não é igual a da foto. Basta umas contas.                                                  

Grandes indústrias, pequenos efeitos – Valor 13/09

Por Paulo Pedrosa

Um ano após a medida provisória 579, que reduziu o custo da energia elétrica, o Brasil não destoa de outros países por não ter uma política energética industrial. Aparentemente nós a temos -só que destoamos porque a nossa é desfavorável à produção. A decisão da Alcoa de reduzir a produção de alumínio no país é o mais recente indício de que graves problemas continuam comprometendo a competitividade da energia, justamente o conceito que teria motivado a edição da MP. A correção desses problemas, portanto, resgata e valoriza compromissos assumidos pelo governo. Além do reconhecimento da energia como um fator de competitividade que não deveria ser onerado com o custo de políticas públicas, outro ganho conceitual da MP foi o entendimento de que o vencimento das concessões de geração e transmissão deveria se dar em favor dos consumidores.

O problema é que, no campo dos ganhos concretos, a distribuição dos benefícios revela um paradoxo: os efeitos foram tão menores quanto maior a importância da energia para a produção. Perdeu-se o potencial de propagação da competitividade a partir das bases das cadeias produtivas que são, pela natureza de seus processos, grandes consumidoras. Para essas empresas, a redução média do custo da energia foi de apenas 7,5%. Algo a se comemorar, mas pouco para estimular a produção e menos ainda para promover novos investimentos. 

Os preços do shale gas estão viabilizando a recuperação industrial e da própria economia da América do Norte. 

O processo apenas agravou as distorções do mercado que tornam a grande indústria, que contrata a energia diretamente de produtores e comercializadores no mercado livre, subsidiadora do sistema. No Brasil, a relação entre os custos da energia para os consumidores de baixa e de alta tensão é a mais desfavorável possível para a produção, relação que se radicaliza quando a referência são as grandes indústrias. 

Os preços da energia foram descaracterizados por intervenções de toda natureza e parte dos custos que neles deveriam estar contidos migrou para a conta de encargos, paga por fora pelos consumidores, agregando imensa imprevisibilidade ao custo final da energia. 

O Encargo de Serviços do Sistema - em favor da segurança do abastecimento - e o de Energia de Reserva redistribuem custos do sistema entre os consumidores de forma desequilibrada: os que se protegem por meio de contratos de longo prazo tornam-se subsidiadores daqueles expostos aos riscos do curto prazo e financiadores do ganho fácil dos que buscam vantagens nas ineficiências do sistema. Absorvem, ainda, sem transparência, falhas na gestão do sistema, como nos casos de atrasos de obras. 

Nas concessões, as grandes indústrias receberam tratamento desigual. Pagaram empréstimos compulsórios - não devolvidos - para a construção das usinas, por sua depreciação na energia comprada e contribuíram para o fundo que indenizou seus concessionários, mas não receberam a parcela da energia que lhes caberia. Aqui subsidiaram os consumidores das distribuidoras, também favorecidos no tratamento das concessões de transmissão, juntamente com os geradores, que capturaram ganhos que deveriam ter sido direcionados ao consumo.

A tendência negativa para as grandes indústrias também se confirma na expansão do setor. O modelo estimula os interessados em construir as usinas a vender a energia ao preço mais alto possível para as indústrias consumidoras livres, de modo a subsidiar tarifas mínimas ao mercado regulado, critério de seleção dos leilões. E, as indústrias de base, além de não terem acesso à energia competitiva, sofrem com outras consequências do modelo de contratação, ao pagar indiretamente pelo aumento de custos que os empreendimentos podem impor ao sistema no tocante a transporte, perdas e para "firmar" a energia e potência associadas.  

Precisamos definir uma política de oferta de energia em favor da produção nacional, dando clareza a quanto priorizamos a competitividade do país, em um cenário em que os concorrentes globais não estão parados. Os preços do shale gas estão viabilizando a recuperação industrial e da própria economia na América do Norte e são cada vez mais comuns políticas públicas focadas na produção dos eletrointensivos europeus, com a alocação da energia das velhas concessões nucleares e a desoneração dos custos de transporte ou do peso das renováveis. Países como México e China também fazem da oferta de energia competitiva um grande desafio de política nacional e, aqui na América Latina, países como Peru oferecem condições melhores que as nossas. 

O Brasil tem espaço para seguir na trajetória sinalizada pelo governo no ano passado. Para isso, precisamos de uma política industrial e de condições de produção que reconheçam o papel da indústria. Certamente esse papel não é o de subsidiadora do sistema. Temos de garantir o acesso das grandes indústrias à energia das concessões que vencem em 2015 e ainda não foram renovadas, permitir que a indústria tenha acesso, em condições favoráveis, aos leilões competitivos da expansão e corrigir distorções nos encargos que tornam o preço absolutamente imprevisível e desproporcional ao que o Brasil poderia oferecer. Esta é a base da agenda do desenvolvimento estrutural e sustentável, do emprego e da estabilidade econômica. 

(Paulo Pedrosa é presidente-executivo da Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres - Abrace)

 


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