quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Trem-bala, outra teimosia e mais uma lambança de Dona Dilma

Burrice e teimosia, temperadas com soberba, são insuportáveis e incuráveis -- e, quando compõem o perfil de um governante, são catastróficas. Nossa doce, terna, meiga, suave e sempre sorridente Dona Dilma virou padrão de referência nesses quesitos. Suas lambanças se acumulam e se atropelam -- a madame consegue errar praticamente em tudo em que mete o bedelho (e ela não faz outra coisa).

Retratando talvez um trauma de infância-- não deve ter tido bonecas para brincar --, nossa Dama de Ferrugem encasquetou com um tal de trem-bala e transformou-o numa cruzada à sua moda. Talvez porque ela governe um país em que educação, saúde, transportes (de passageiros e de cargas), segurança têm atendimento exemplar, de primeiro mundo, e os impostos também. Então, está na hora de entrar para o seleto clube dos países que têm TAV (Trem de Alta Velocidade, apelidinho oficial do trem-bala). Na sua cabecinha mirabolante, ela deve achar por exemplo que isso nos ajudará a ter assento no Conselho de Segurança da ONU. Já fiz várias postagens sobre o nosso trem-bala: em 21/11/2012 ("Leilão para operação do trem-bala tem cronograma novamente adiado"), em 26/8/2012 ("Governos erram e nós pagamos a conta"), em 07/7/2012 ("Trem-bala terá licitação internacional") e em 14/2/2011 ("O trem-bala é uma via de alta velocidade para o desperdício do governo").

Esse brinquedo da supersimpática ex-guerrilheira é um trem de passageiros (sem possibilidade de uso para transporte de cargas, a não ser pequenas encomendas), com possíveis estações intermediárias em São José dos Campos, Aparecida do Norte, Resende, Volta Redonda e Barra Mansa. Os aeroportos de Viracopos (Campinas), Guarulhos (São Paulo) e Galeão (Rio de Janeiro) também seriam servidos por estações. A distância total a ser percorrida é de 511 km, sendo que o trecho principal (Rio – São Paulo) teria 412 km. O tempo mínimo de viagem entre Rio e São Paulo seria de 1 hora e 33 minutos, caso venha a ser possível atingir velocidade máxima de 300 km por hora e sem paradas. A viagem do Rio a Campinas, com paradas, levaria 2 horas e 27 minutos.

Trata-se de um projeto caríssimo, de necessidade, premissas e prioridade que não se sustentam. Estimado inicialmente em R$ 15 bilhões de recursos públicos (dinheiro do Tesouro), seu custo já pulou para R$ 35 bi mas os especialistas acham que poderá chegar facilmente a R$ 50 bi ou R$ 60 bi tendo em vista a série de falhas em sua concepção, e as mudanças que já sofreu antes sequer de ser projetado. Avaliações recentes  estimam que, mesmo que não saia do papel, o trem-bala custará ao país a bagatela de R$ 1 bilhão (isso até 2014 -- se a Dama de Ferrugem for reeleita, bota cifrão nisso)! Como somos um país de ovelhas idiotas, pagaremos mais essa conta sem chiar, ninguém será responsabilizado e preso, e ainda há o risco de reelegermos a mãe de mais esse monstrego (aliás, a "prole" da Dona Dilma presidente só tem Quasímodos -- um outro é o PAC).

Recomendo fortemente a leitura do trabalho "Trem de Alta Velocidade: novas informações para debater o projeto", de Marcos Mendes, do Centro de Estudos da Consultoria do Senado, Textos para Discussão (82), Janeiro de 2011, já citado e usado acima, e do qual copiei o quadro e as tabelas abaixo. Esse trabalho reduz o TAV da Dona Dilma a subnitrato de pó de traque.

O quadro abaixo (elaborado por Marcos Mendes, do site Brasil - Economia e Governo) mostra o absurdo da ideia do trem-bala:

Custo total estimado para construção do TAV Rio de Janeiro – Campinas, para outros projetos de infraestrutura de grande vulto e despesa efetivamente realizada em infraestrutura ferroviária e aeroportuária
R$ bilhões
TAV 1 34,6
Usina Hidrelétrica de Belo Monte 2 19,0
Usina Hidrelétrica de Santo Antônio 3 8,8
Usina Hidrelétrica de Jirau 4 8,7
Ferrovia Norte-Sul 5 6,5
Ferrovia Transnordestina 6 5,4
Transposição do Rio São Francisco 7 4,5
Invest. público e privado em ferrovias de 1999 a 2008 8 16,6
Invest. público em aeroportos de 1999 a 2008 9 3,1

[1] Estas estimativas foram feitas em artigo do autor (Marcos Mendes) sobre o tema, disponível em http://www.senado.gov.br/senado/conleg/textos_discussao/NOVOS%20TEXTOS/TD%2082%20-%20Marcos%20Mendes.pdf
[2] http://www3.fgv.br/ibrecps/CPS_infra/sumario.pdf
[3] Fonte: Valor Econômico, edição de 22 de março de 2011.
[4] Tais estudos estão disponíveis em www.tavbrasil.gov.br
[5]Governo Federal. Ferrovias- Resultados 2007 a 2010
[6] Governo Federal. Ferrovias- Resultados 2007 a 2010
[7] Ministério da Integração Nacional.http://www.integracao.gov.br/saofrancisco/perguntas/index.asp [não consegui acessar esta informação -- na informação "Obras do Projeto São Francisco são remobilizadas", do mesmo Ministério, consta o valor de R$ 6,8 bilhões]
[8] IPEA (2010a)
[9]IPEA (2010b)
Para ler mais sobre o tema:
Mendes, Marcos (2010) Trem de alta velocidade: caso típico de problema de gestão de investimentos. Centro de Estudos da Consultoria do Senado. Texto para Discussão nº 77. Disponível em http://www.senado.gov.br/senado/conleg/textos_discussao/NOVOS%20TEXTOS/Texto%2077%20-%20Marcos%20Mendes%20-%20TAV.pdf
Mendes, Marcos (2010) Trem de alta velocidade: novas informações para debater o projeto. Centro de Estudos da Consultoria do Senado. Texto para Discussão nº 82. Disponível em http://www.senado.gov.br/senado/conleg/textos_discussao/NOVOS%20TEXTOS/TD%2082%20-%20Marcos%20Mendes.pdf

Como pau que nasce torto permanece torto, o trem-bala da Dona Dilma -- tem gente chamando-o de "pau de arara da guerrilheira", o que é humor nigérrimo -- acaba de sofrer mais um adiamento, por mais um ano. Entre os três consórcios que haviam mostrado interesse, dois eram liderados por empresas envolvidas no escândalo do metrô de S. Paulo (Alstom e Siemens). Como a nossa afável presidente leva tombo mas não perde a pose, ela agora -- depois desse novo adiamento e da gritaria crescente contra o TAV -- cogita de um trem de média velocidade para substituir seu trenzinho-bala. Embora seja um recuo parcialmente benéfico -- o ideal seria gastar a dinheirama com necessidades mais prementes -- ele se soma ao quadro de desistências da nossa Dama de Ferrugem, prova inequívoca de que para ela planejamento é palavrão. 

Alguns  dados adicionais do TAV brasileiro:


Custo estimado para construção do TAV Rio de Janeiro - Campinas

Item do projeto
Custo (R$ bilhões de 2009)
Custo
(USS$ bilhões) [1]
% do Total
Terraplenagem
2,21
1,23
6,00%
Túneis
10,75
5,97
31,00%
Pontes e viadutos
7,12
3,96
21,00%
Muros de contenção
0,28
0,16
1,00%
Via permanente
2,14
1,19
6,00%
Estações
0,71
0,39
2,00%
Locomotivas
0,06
0,03
0,00%
Outros custos de edificações e equipamentos
0,65
0,36
2,00%
Sinalização
0,32
0,18
1,00%
Telecomunicações
0,31
0,17
1,00%
Eletrificação
1,37
0,76
4,00%
Aquisição de terras [2]
0,6
0,33
2,00%
Indenizações de construções [2]
1,6
0,89
5,00%
Outros custos socioambientais [2]
1,7
0,94
5,00%
Material rodante
2,7
1,50
8,00%
Serviços complementares
2,1
1,17
6,00%
TOTAL
34,62
19,23
100,00%
TOTAL EXCETO CUSTOS SOCIOAMBIENTAIS
30,72
17,07
89,00%
MEMO






CUSTO TOTAL POR KM (MILHÕES)
68
38


CUSTO TOTAL POR KM EXCETO CUSTOS SOCIOAMBIENTAIS (MILHÕES)
60
33


Elaborado por Marcos Mendes. Fonte: Consórcio Halcrow-Sinergia (2009).
[1] Considerando taxa de câmbio R$/USS de 1,80.
[2] Itens considerados como custos socioambientais.


Características de projetos de TAV que elevam seus custos, e a situação brasileira

Características que oneram um projeto de TAV
Situação brasileira
Traçado inclinado.
Forte inclinação, saindo do nível do mar e chegando a 760 m de altitude.
Grande quantidade de túneis, pontes e viadutos
39% do trajeto nessas condições.
Construção de linha exclusiva, não aproveitando malha férrea, estações e outras instalações já existentes.
Linha totalmente exclusiva, sem qualquer aproveitamento de infraestrutura já existente.
Necessidadede pagamento de compensação ambiental.
Alta, pois atravessará área de mata atlântica nativa.
Custos de desapropriações em áreas de alta densidade populacional.
Cortará áreas de alta densidade populacional não apenas nas grandes cidades (Rio, São Paulo e Campinas), mas também nas cidades médias ao longo do trajeto (Jundiaí, Guarulhos, São José dos Campos).
Sistema de proteção contra terremotos.
Não se aplica.
Tabela elaborada por Marcos Mendes. Fonte: bibliografia citada pelo autor no final de seu trabalho.

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