sábado, 6 de outubro de 2012

Japoneses abandonam eletrodomésticos para economizar energia

[Temos muitíssimo a aprender com vários países asiáticos, em particular com o Japão. A terceira maior economia do planeta nos deu recentemente um notável exemplo de cidadania, com seu comportamento durante e após as catástrofes -- terremoto e tsunami -- que a atingiram no ano passado. Agora, nos vem outro exemplo impressionante dos japoneses no que é ainda um desdobramento dessas tragédias, que abalaram o setor elétrico e a economia japoneses. A reportagem é de Phred Dvorak, para o Wall Street Journal de 04/10, traduzida pelo jornal Valor Econômico. Mantive o texto como publicado, apesar de certos termos pouco ou nada ortodoxos quanto a energia elétrica, mas que não prejudicam em nada sua mensagem. O que estiver entre colchetes e em itálico é de minha responsabilidade.]

Megumi Arakida tem uma máquina de lavar elétrica azul e branca, mas não a usa mais. Agora ela esfrega as roupas em uma velha tábua de lavar que seu marido ganhou da avó. Essa japonesa de 35 anos de idade também desistiu da escova de dentes elétrica, do aspirador de pó e, apesar das objeções do marido, Makoto – também da televisão de 24 polegadas do casal. Tudo isso em um esforço intenso para economizar eletricidade.

Agora, os Arakida, que moram em uma pequena casa nesta comunidade rural a 140 quilômetros a oeste de Tóquio, estão usando a mesma quantia de energia elétrica que a família japonesa média consumia em 1960. Bastaria ligar um forno de microondas para sobrecarregar sua pequena caixa de disjuntores. "Quando contei aos meus pais que a nossa conta de energia elétrica estava em menos de 1.000 ienes (US$ 13) por mês, eles perguntaram: 'Que tipo de vida vocês dois estão levando?''' diz, rindo, Arakida, de 46 anos, ex-engenheiro mecânico que agora conserta guitarras profissionalmente. "Eles estão um pouco preocupados".

 Megumi Arakida usa uma tábua de lavar roupa, deixando a máquina de lavar de lado para economizar energia - (Foto: Phred Dvorak/Wall Street Journal).

Os Arakida são parte de um número crescente de japoneses que procuram viver fora da rede elétrica, ou pelo menos diminuir seu consumo de eletricidade, reduzindo a capacidade da caixa de disjuntores – uma forma extrema de conservação de energia que restringe a quantidade de energia elétrica que uma casa pode consumir sem que os disjuntores caiam.

Chamado "Abaixo os Amperes", o movimento começou em 2007, quando um grupo chamado Clube da Preguiça propôs trocar suas caixas de disjuntores por outras de capacidade menor, como forma de protestar contra o moderno estilo de vida japonês, tão acelerado e voraz consumidor de energia, e promover uma vida menos "amperada".

A ideia surgiu com um professor de inglês e ativista da energia renovável de Hokkaido chamado Peter Howlett, um canadense que estava buscado maneiras de reduzir a energia consumida por sua família de cinco pessoas. Se muitas pessoas aderissem à causa, raciocinou ele, os picos na demanda de energia do Japão iriam cair.  

Quando a família Howlett reduziu seu consumo máximo de eletricidade de 30 para 20 amperes, os disjuntores caíam todo dia, lembra Howlett.  Mas depois de alguns meses as interrupções caíram para uma vez por mês, pois um avisava o outro antes de usar aparelhos de muito consumo, como aspirador de pó ou secador de cabelo. "Isso nos deixa mais conscientes da energia que estamos usando'', diz Howlett. "Estamos sempre preocupados, com medo que os disjuntores caiam – especialmente quando meu filho acabou de digitar algum trabalho no computador".

A ideia decolou no ano passado, quando o terremoto e tsunami de 11 de março e o consequente acidente nuclear em Fukushima paralisaram grande parte das usinas elétricas do país. As quedas de energia e apagões em muitas áreas do Japão tornaram a conservação de energia uma preocupação central para as famílias. O número de pessoas que mudaram suas caixas de disjuntores, em geral reduzindo a potência, cresceu 50% no ano passado em comparação com o ano anterior. Foram tantos que a Tokyo Electric Power Co., a maior concessionária de eletricidade do Japão, informou que em certo momento ficou sem esses equipamentos.

Comparados com os americanos, os japoneses já são muito econômicos em energia. Mais de 40% dos consumidores domésticos normais da Tepco – a maior percentagem deles – têm caixas de 30 amperes. Nos Estados Unidos, 100 amperes é a potência comum para as caixas de disjuntores principais nas residências novas, e muitos clientes estão optando por 200 amperes. No Brasil, é comum encontrar caixas com 100 amperes ou menos. 

O Japão há muito tem uma boa reputação de conservação de energia, tendo aumentado sua eficiência em 37% nos últimos 40 anos. Agora, porém, algumas famílias japonesas estão reduzindo seus disjuntores para uma potência tão baixa que seria problemática até para uma torradeira – estimulando a divulgação de dicas para economizar energia vindas de grupos de apoio de todo o país.

Um aspirador de pó, por exemplo, consome cerca de 10 amperes – é melhor usar a vassoura. Um aparelho de ar-condicionado japonês também usa cerca de 10 amperes, mas o ventilador elétrico funciona com apenas 1 ampere – e o tradicional leque de mão japonês consome zero.  O arroz tem um gosto melhor quando preparado em uma panela de barro do que em uma panela elétrica, aconselham alguns praticantes do Abaixo os Amperes.

Em Tóquio, a família de Michiko Hasegawa reduziu sua amperagem de 40 para 20. Em novembro, os disjuntores caíram quando a família de seis membros usou ao mesmo tempo microondas (6 amperes), o forno elétrico (10 amperes) e o aquecedor elétrico (6 amperes) e ligou o aquecimento do banheiro, diz Hasegawa. Ela recorda que disse a seus filhos que provavelmente era um espírito travesso que desarmou o circuito.

Apesar das temperaturas escaldantes de verão, os Hasegawas raramente ligam o ar-condicionado em sua casa de três andares, usando ventiladores em seu lugar. Para manter a calma, Hasegawa, seu marido e os quatro filhos bebem chá de cevada gelado, colocam panos umedecidos e gel resfriado ao redor do pescoço e dormem em esteiras de palha fina colocada sobre seus tatames. "Eu acho que é bom suar no verão'', diz Hasegawa, de 41 anos. "Eu quero que meus filhos cresçam e se tornem pessoas que suam" [sem comentários ...].

Dado o consumo de eletricidade da maioria dos aparelhos modernos, "15 amperes é o limite'', diz Hiroshi Kato, líder de um grupo Abaixo os Amperes da prefeitura de Fukui que conseguiu financiamento do Ministério do Meio Ambiente japonês. Ele está tentando baixar de 40 amperes para 30. "Se voltarmos ao estilo de vida de uns 40 anos atrás, dá para conseguir".

[Evidentemente, esse ascetismo típico dos japoneses e de outros povos asiáticos resulta de culturas milenares e de sistemas de educação que levam isso em conta e o preservam.  É inimaginável esperar e sequer imaginar algo remotamente parecido de um país como o Brasil, que não chega a um milênio de idade desde sua descoberta enquanto o Japão só de unificado tem 17 séculos, mas em matéria de mentalidade de poupança em geral -- e energética em particular -- não há nenhuma razão para sermos quase a antítese dos japoneses nesse particular. Já basta sermos seus antípodas geográficos ...

Fico imaginando a reação de um japonês -- ou de qualquer outro ser humano suficientemente civilizado -- se visse a mania do brasileiro de lavar a calçada (especialmente de prédios de apartamentos, mas não tão raramente em residências particulares) e, com o jato d' água, "perseguir" folhinhas de árvores ou outras miudezas absolutamente irrelevantes com uma determinação de quem está eliminando algo abominável, não importa o tempo que isso leve. Na sua ignorância estimulada por ação e omissão do governo, desde a escola, o brasileiro médio acha que a água do Brasil é inesgotável -- portanto não precisa ser poupada -- e sai comprando aparelhos e bugigangas elétricos a torto e a direito -- com ou sem selo Procel -- estimulado pelo modelo consumista, particularmente no governo atual. Alguém já viu Dª Dilma falar em poupar alguma coisa, não importa o quê?].

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