quinta-feira, 12 de julho de 2012

Contracepção: seria esta a real prioridade da África?

Um artigo publicado em 10 de julho no site The Slatest ressuscita um velho tema que, em outros tempos, já foi um mantra mais repisado e já foi objeto de muita controvérsia política: o controle de natalidade no chamado Terceiro Mundo ou, dizem alguns, nos países em desenvolvimento -- duas realidades bastante distintas, que não devem ser confundidas.

A discussão não é simples, e suscita sempre desconfianças. O problema que mais chama a atenção é que, embora o objetivo permaneça o mesmo (reduzir a natalidade), as razões alegadas oscilam: em uma época foi a redução do número de bocas para se alimentar, agora o foco é reduzir a mortalidade materna. Essa oscilação não é um bom sinal. Quando se toca nesse tema, a primeira região do planeta que vem à mente -- de ambos os lados da questão -- é a África, decidida e inequivocamente a maior, mais assustadora e mais revoltante vitrine da hipocrisia planetária. No continente negro a fome é endêmica, e atinge mais de 200 milhões de pessoas segundo a ONU (um quarto de sua população de 856 milhões de pessoas), o que é uma porta escancarada para o agravamento de inúmeras doenças, como a AIDS e a tuberculose: embora responsável por pouco mais de 12% da população mundial, a África é a região mais atingida pelo vírus da AIDS (estima-se que 60% de sua população estejam infectados), havendo ali uma sinergia mortal entre o HIV e a tuberculose.

Não bastassem as tragédias da fome e das doenças, a África foi e tem sido palco de  ditaduras, na maioria longas e sangrentas (embora alguns governos curtos tenham sido igualmente sangrentos, como por exemplo o de Laurent Kabila na República Democrática do Congo, ex-Zaire), e inúmeros casos de genocídios: Angola (José Eduardo dos Santos dirige o país há 33 anos), Camarões, Chade, Congo (República Democrática do Congo, ex-Zaire), Egito, Etiópia, Guiné Equatorial, Líbia, Ruanda, Somália, Sudão (antes da independência do Sudão do Sul, com o trágico genocídio de Dafur), Togo, Uganda, Zimbábue -- uma lista que certamente não é exaustiva.

Diante desse quadro terrível, o que faz o resto do mundo com relação à África?  A rigor, nada, absolutamente nada, exceto alguns casos pontuais de ações de empresas ou pessoas, mas não de governos -- ou, então, lhe propõe um controle de natalidade. A ONU, como sempre, produz muito blá-blá-blá e é tão produtiva quanto um eunuco num harém (vide Síria, seu mais recente fracasso).  E o show de hipocrisia continua. Na recente Rio+20, os EUA via Hillary Clinton anunciaram pomposamente a doação da merreca de US$ 20 milhões para "financiar energia limpa na África" ... Quando se vê a montanha de dinheiro despejada pelo governo americano para socorrer empresas imobiliárias e bancos, quando se fica sabendo que as famílias americanas gastaram em 2011 a bagatela de US$ 50 bilhões com animais domésticos  e que, nesse mesmo ano, entre as despesas "militares" dos EUA no Afeganistão houve uma "continha" de US$ 20 bilhões com ar-condicionado, chega-se facilmente à óbvia conclusão de que Dª Hillary deveria ter poupado nossos ouvidos e nossa inteligência, e os africanos de mais um escárnio.

Depois disso, não há como abordar isentamente o artigo sobre controle de natalidade na África.

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