quinta-feira, 14 de junho de 2012

Dólar estimula exportação de etanol aos EUA -- e o abastecimento interno, como fica?

No fim de semana passado, o jornal Valor Econômico publicou que com a desvalorização do real frente ao dólar o etanol brasileiro está mais competitivo, o que estimula sua exportação aos EUA.  Por conta disso, a subsidiária da Raízen (associação entre Cosan e Shell para comercialização de etanol) já fechou neste ano contratos para exportar 500 milhões de litros de etanol para o mercado americano -- isso equivale a todo o etanol embarcado durante todo o ano passado. A previsão da empresa é, neste ano, exportar mais 20% a 30% do que em 2011 para os EUA. Em contrapartida, espera-se o etanol de milho americano fique competitivo para ser importado pelo Brasil no segundo semestre deste ano.

Segundo o vice-presidente de logística da Raízen, Leonardo Gadotti Filho, essa operação de exportação independe da oferta de etanol no mercado interno, que pode [o grifo é meu] ser maior que a prevista no ano passado caso [é bom prestar muita atenção nesta palavra] as usinas brasileiras reduzam a produção de açúcar e aumentem a de etanol [ou seja, o mercado interno terá restrição de uma commodity ou de outra].  "Não há impacto na oferta interna, pois levamos etanol brasileiro e trazemos o americano. É uma troca de volumes", diz ele.

Ganha um doce quem adivinhar se o nosso mercado interno vai "dançar" -- como, aliás, já vem dançando há algum tempo -- nesse confronto com o mercado externo.  Certamente achando que todo mundo é analfabeto nesse assunto, o Sr. Gadotti vem com essa história de que se trata apenas de uma "troca de volume" entre o nosso etanol e o americano -- ele sabe que não é bem assim(se não souber, tem que mudar de ramo de negócio e passar a vender vassoura de piaçava). O "X" da questão é que o nosso etanol de cana-de-açúcar é um combustível melhor que o americano, que é de milho. E quem afirma isso é um respeitado órgão do próprio governo americano, a EPA - United States Environmental Protection Agency -- só na redução de emissão de gases de efeito estufa o nosso etanol é três vezes mais eficiente que o americano.

U.S. Environmental Protection Agency
Life cycle Year 2022 GHG emissions reduction results for RFS2 final rule[96]
(includes direct and indirect land use change effects and a 30 year pay back period at a 0% discount rate)
Renewable fuel Pathway
(for U.S. consumption)
Mean
GHG emission
reduction(1)
GHG emission
reduction
95% confidence
interval(2)
Assumptions/comments
Corn ethanol
21%

7–32%
New or expanded natural gas fired dry mill plant, 37% wet and 63% dry DGS it produces, and employing corn oil fractionation technology.
Corn biobutanol
31%

20–40%
Natural gas fired dry mill plant, 37% wet and 63% dry DGS it produces, and employing corn oil fractionation technology.
Sugarcane ethanol(3)
61%

52–71%
Ethanol is produced and dehydrated in Brazil prior to being imported into the U.S. and the residue is not collected. GHG emissions from ocean tankers hauling ethanol from Brazil to the U.S. are included.
Cellulosic ethanol from switchgrass
110%

102–117%
Ethanol produced using the biochemical process.
Cellulosic ethanol from corn stover
129%

No ILUC
Ethanol produced using the biochemical process. Ethanol produced from agricultural residues does not have any international land use emissions.
Biodiesel from soybean
57%

22–85%
Plant using natural gas.
Waste grease biodiesel
86%

No ILUC
Waste grease feedstock does not have any agricultural or land use emissions.
Notes: (1) Percent reduction in lifecycle GHG emissions compared to the average lifecycle GHG for gasoline or diesel sold or distributed as transportation fuel in 2005.
(2) Confidence range accounts for uncertainty in the types of land use change assumptions and the magnitude of resulting GHG emissions.
(3) A new Brazil module was develop to model the impact of increased production of Brazilian sugarcane ethanol for use in the U.S. market and the international impacts of Brazilian sugarcane ethanol production. The Brazil module also accounts for the domestic competition between crop and pasture land uses, and allows for livestock intensification (heads of cattle per unit area of land).

Ainda não vi nenhum artigo ou relatório com qualquer teste sobre o desempenho dos nossos carros flex ou a álcool  com o etanol de milho dos EUA.

A questão do etanol como combustível no Brasil é muito complicada, é coisa p'ra divã bravo com um analista da pesada. Do lado da gasolina, simplificadamente o que se tem é: a) o governo estimulando fortemente o consumo com o aumento da produção e venda de carros, via redução de IPI -- ; - b) o preço da gasolina está há bem mais de ano artificialmente controlado pelo governo, o que estimula o seu consumo (o que dá um baita prejuízo à Petrobras -- parece que o lema do PT agora é "a Petrobras é nossa, e o prejuízo também --; o benefício dessa gasolina "barata" é ilusório, porque além de bagunçar a cadeia de produção de combustíveis  da empresa e do país, o Brasil é forçado a importar mais gasolina e a conta não fecha. 

Do lado do álcool, tem-se: a) a disputa entre o açúcar e o álcool, no mercado interno e no externo -- o usineiro produz obviamente o que lhe for mais vantajoso, dane-se o mercado automotivo e o que for; - b) com a gasolina artificial e mentirosamente barata, o álcool não consegue absolutamente ser competitivo com ela, seu consumo cai e isso desestimula sua produção, criando-se um círculo vicioso; - c) o aumento de consumo de gasolina, por outro lado, afeta diretamente a produção, o consumo e o preço do álcool, por causa da adição obrigatória de álcool à gasolina (que já foi de 25% e o governo teve de reduzir para 20% para evitar desabastecimento de álcool (o governo acabou criando uma "banda" para essa adição, que agora vai de 18% a 25%, mostrando que o mercado de combustíveis -- e principalmente o do álcool -- no país é administrado mais na base do espasmo) ... Se correr, o bicho pega, se ficar, o bicho come.  Enquanto isso, os investimentos em carros a álcool e flex vão p'ro beleléu, tanto pelo lado da indústria quanto pelo lado do consumidor.

Vejam postagem anterior: "Etanol brasileiro: um pepino, um abacaxi, ou ambos?".

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