quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Celular e e-mail fora do trabalho podem dar direito a hora extra

Em tempos de popularização dos smartphones, uma lei que acaba com a distinção entre trabalho dentro da empresa e à distância, sancionada pela presidente Dilma Rousseff no final de 2011, já gera polêmica entre empregados e empregadores.


E-mail e celular estendem jornada de trabalho até as férias

A legislação, que alterou a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), diz que o uso de celular ou e-mail para contato entre empresas e funcionários equivalem, para fins jurídicos, às ordens dadas diretamente aos empregados, informa reportagem de Maeli Prado e Priscilla Oliveira publicada na Folha desta quinta-feira.  A íntegra está disponível para assinantes do jornal e do UOL (empresa controlada pelo Grupo Folha, que edita a Folha).

De acordo com advogados especializados, a mudança abre espaço para que funcionários que usam o celular para trabalhar após o horário de expediente, por exemplo, recebam horas extras por isso.  

Até agora, a legislação trabalhista colocava no mesmo patamar o trabalho no escritório e o feito em casa, mas não mencionava o uso de tecnologias que permitem que o funcionário possa produzir onde quer que esteja.  "A CLT foi promulgada em 1943, quando não havia os meios de comunicação atuais", diz a advogada trabalhista Aparecida Hashimoto, do Granadeiro Guimarães Advogados. "Mesmo que o funcionário atenda uma ligação por cinco minutos, ele está trabalhando. Deveria ter direito a receber".  Ou seja, quando o empregado tem acesso remoto inclusive ao sistema da empresa.

É uma interpretação oposta à de entidades empresariais, como a Confederação Nacional da Indústria (CNI), que rebatem que o objetivo do projeto de lei do deputado Eduardo Valente, de 2004, que deu origem à mudança da CLT, era somente regular o trabalho à distância.  "Para nós essa interpretação foi uma surpresa porque o objeto, o sentido da lei era regular, garantir segurança, e não gerar insegurança", afirma Emerson Casali, gerente-executivo de Relações do Trabalho e Desenvolvimento Associativo da CNI.

Revisão

A mudança na legislação já faz com que o TST (Tribunal Superior do Trabalho) considere revisar uma súmula, de maio do ano passado,que estabelece que o uso de pagers ou celulares corporativos não caracteriza o "regime de sobreaviso". Se o funcionário está de sobreaviso, a lei determina que a empresa pague a ele um terço do valor que desembolsaria na hora do expediente.

Com a alteração na CLT, o tribunal trabalha com três cenários possíveis para revisar a jurisprudência. O primeiro seria considerar o pagamento por regime de sobreaviso, com um terço da hora trabalhada. O segundo seria considerar o contato vias email ou celular como hora normal de terabalho, e o terceiro seria manter a súmula e não pagar nada a mais.

Essa mudança na legislação trabalhista, que colocou o trabalho à distância no mesmo patamar que o trabalho no escritório, acentuou a corrida de empresas para se defender de ações judiciais para pagamento de hora extra.

Luiz Fernando Alouche, sócio responsável pela área trabalhista no Almeida Advogados, afirma que o escritório já elabora, a pedido de empresas, sugestões de políticas internas a serem seguidas fora do horário de expediente. "A ideia é evitar abusos ou empregados agindo de má-fé. A orientação é que essas políticas internas determinem que o funcionário não pode mandar e-mails ou fazer ligações para a empresa fora do seu local de trabalho".

Horário flexível

Atualmente, o escritório de advocacia faz trabalhos nesse sentido para três empresas dioferentes, todas de tecnologia da informação, um dos setores mais afetados pela mudança na legislação. "No mundo atual, está se tornando cada vez mais comum a pessoa desenvolver o trabalho no horário que lhe convier", defende Luís Mario Luchetta, presidente da Associação das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação. "Para o contratante, o importante é que o funcionário cumpra com seus objetivos no prazo de entrega e com qualidade", completa.

Na avaliação do advogado especializado Estevão Mallet, do Mallet Advogados Associados, a mudança na legislação apenas explicitou algo que já esta implícito anteriormente. "Não acredito que as empresas passem a pagar hora extra porque ligam ou mandem mensagens para seus funcionários", afirma.

Volkswagen

Tecnologia da informação não é o único setor em que começam a ocorrer mudanças nas relações de trabalho por conta de avanços tecnológicos. Na Alemanha, a montadora Volkswagen aceitou poupar funcionários dos e-mails que chegavam via celulares corporativos fora do expediente. Após acordo entre patrões e empregados, a função foi desativada dos aparelhos durante a noite, e os empregados passaram a receber e-mails até meia hora antes ou depois da hora de trabalho.

Benefício

Essa lei que prevê o pagamento de horas extras para funcionários contatados fora do horário de trabalho poderá beneficiar muitos brasileiros. Pesquisa realizada pela Asap, consultoria de recrutamento de executivos, e divulgada pela Folha em novembro revelou que mais de 50% dos empregados brasileiros respondem e-mails de trabalho durante as férias. Foram entrevistadas 1.090 pessoas com renda mensal entre R$ 5.000,00 e R4 15.000,00.

O levantamento mostrou ainda que 80% dos funcionários são acionados pela empresa, nas folgas, por mensagens de celular. E mais da metade dos entrevistados disse que o teto da carga horária aumentou de oito para dez horas diárias.




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