segunda-feira, 18 de julho de 2011

O problema real do euro

A crise do euro é tão política quanto financeira. Quem quer que esteja tentando entender porque a Europa se mostrou incapaz de dar um fim à crise do euro pode encontrar algumas respostas em um jantar mal-humorado numa reunião de cúpula em 28 de outubro de 2010. A discussão era sobre uma solicitação da França e da Alemanha, feita dias antes em Deauville, para que se fizesse uma mudança de tratado para criar um sistema permanente com o objetivo de resgatar países incapazes de pagar suas dívidas. Todo mundo resmungou. Tinham sido gastos anos de tribulação para se chegar a um acordo sobre o tratado da União Europeia (UE), assinado em Lisboa e que apenas recentemente (01/12/2009) havia entrado em vigor. Esse acordo produziu para a UE e seus 27 Estados-membros um novo quadro jurídico e novos instrumentos legais. Mas todos se renderam a Angela Merkel, a chanceler alemã, que queria evitar qualquer desafio ao novo sistema pela corte constitucional da Alemanha.

Entretanto, Jean-Claude Trichet, presidente do Banco Central Europeu (BCE), preocupava-se com algo mais: o pedido dela (Angela) para que futuros resgates incluam necessariamente uma "adequada participação de credores privados",   significaria perdas para portadores de títulos. Isso poderia apenas alarmar os mercados, ele achou, ainda tensos com a crise da Grécia na primavera. "Vocês não percebem a gravidade da situação ...", começou Trichet -- mas foi interrompido por Nicolas Sarcozy, presidente da França, que, de francês para francês, disse: "Talvez o Sr. esteja falando com ou de banqueiros -- nós temos que prestar contas aos cidadãos". A chanceler entrou na conversa e disse: pagadores de impostos não podem ser solicitados a se responsabilizar pelo pagamento da conta toda, não quando eles acabaram de pagar para salvar os bancos.

Os políticos ganharam o dia. Mas as preocupações do Sr. Trichet também se justificaram, já que o contágio da crise se espalhou e agora está envolvendo a Itália. A discussão na mesa de jantar mostra como, por toda a crise da dívida soberana, as exigências de gestão dessa crise têm colidido com prioridades políticas, legais e emocionais. De fato, os infortúnios do euro têm tanto de política quanto de finanças. Autoridades europeias como o Sr. Trichet papagueiam que no geral a dívida e o déficit da zona do euro apresentam melhores condições que os mesmos problemas nos EUA. Mas, a Europa carece ainda de grandes orçamentos federais e de instituições financeiras para redistribuir renda e absorver choques econômicos -- e não possui um regime ou sistema único para mediar tensões dentro e entre seus países-membros. Já é suficientemente difícil conseguir-se que os californianos salvem os banqueiros de Wall Street -- não é de se espantar que os alemães fiquem arrepiados quando são chamados a resgatar os burocratas gregos.

A Grécia necessita agora de mais ajuda, a hipótese de default está mais próxima, e alemães e holandeses ameaçam criar dificuldades, querem que os credores privados dêem logo sua contribuição. Isso levou a uma disputa franca e aberta com o Sr. Trichet, que argumenta que mesmo o mais leve reescalonamento arrisca provocar uma convulsão comparável à do colapso do Lehman Brothers. Ele ameaçou, se houver qualquer tipo de default, cortar os créditos dos bancos gregos, empurrando muitos deles para a falência. Diante disso, pode existir alguma surpresa que os investidores estejam abandonando os títulos vulneráveis da zona do euro?
Caricatura de Peter Schrank (The Economist). Clique na imagem para aumentá-la.

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